segunda-feira, 11 de março de 2019

O PINTASSILGO (2013) - DONNA TARTT




O Pintassilgo de Donna Tartt - romance vencedor do prêmio Pulitzer - foi um dos meus livros abandonados em 2018 que decidi retomar em 2019. Quando abandono determinada obra e me proponho a retoma-la sou tomada de um certo transtorno obsessivo compulsivo que absolutamente me impede de continuar do ponto em que parei. Tenho que começar desde o início. Sempre. E essa foi uma das minhas principais dificuldades.

Abandonei o Pintassilgo duas vezes antes. Não fosse a minha teimosia e a certeza de que se mais uma vez eu o deixasse, desistiria completamente da leitura, teria abandonado mais uma vez esse ano. E veja bem: seria uma verdadeira injustiça (e ignorância, convenhamos) se eu dissesse que esse livro tão aclamado pela crítica, é ruim. Não é. Mas eu preciso assumir - não sem uma certa culpa - que não é meu estilo de narrativa, arrastada, muito descritiva e sem espaços para muitas reflexões.

O Pintassilgo é um romance de formação onde acompanhamos uma boa parte da vida de Theodoro Decker, desde a sua adolescência até a fase adulta. O romance inicia com Theo perdendo a mãe em um atentado ocorrido no museu em Nova York, do qual ele - que também foi vítima - sai milagrosamente ileso. Desse evento, Theo leva consigo uma pintura de Fabritius (a preferida da sua mãe, O Pintassilgo - daí o nome da obra) e um anel de família (Blackwell & Hobart) entregue a Theo por Welt, um senhor idoso que também é uma das vítimas do atentado e que estava, minutos antes, com Pippa, uma menina que havia chamado a atenção de Theo.

O Pintassilgo (1654, Carel Fabritius)


Depois de ficar temporariamente com Os Barbour - a família rica de um amigo da escola (Andy) - e de entregar o anel para Hobie, sócio de Welt em uma loja de antiguidades, Larry, o pai alcoólatra de Theo, e sua esposa Xandra, resolvem busca-lo e acabam levando-o a Las Vegas, local onde Theo conhece Boris, um russinho igualmente devastado. É o início de uma amizade que se prolongará no tempo, apesar de todas as voltas que a história dá.

Boris e Theo entram em um mundo de autocomiseração, depressão e uso de drogas. Nessa época Theo, ciente que estava praticando um crime ao reter uma obra de arte famosíssima (ele ainda está com o Pintassilgo de Fabritius), a esconde embaixo da cama e não a menciona sequer para Boris. A pintura passa a ser para Theo uma obsessão, assim como a lembrança de Pippa. 

Um parênteses - Donna Tartt descreve o indescritível. Ela consegue com muita habilidade expressar em palavras o poder da arte:
Depois da trágica morte de Larry - envolvido com esquemas ilegais de jogos em Las Vegas - Theo, ainda adolescente, retorna a Nova York e vai trabalhar na loja de antiguidades com Hobie, ficando por lá até a idade adulta, perdendo o contato totalmente com Boris, mas estreitando o contato com Pippa. Theo alimenta cada vez mais seu amor platônico, continua se drogando (com remédios, geralmente) e assume facetas não muito confortáveis para o leitor (afinal ele é a vítima, não é?). Theo passa a fazer algumas vendas fraudulentas na loja e mantém o Pintassilgo, por todos os anos, guardado num depósito em condições [nem tão] adequadas de conservação e temperatura.

Daí pra diante tudo acontece com muita rapidez: (1) Theo descobre que Andy morreu, (2) se aproxima de Kitsey (irmã de Andy) e de repente está noivo, (3) uma das fraudes  na loja é descoberta por um dos clientes que passa a chantageá-lo, presumindo que ele está com a pintura de Frabitius, considerando seu histórico trágico da infância (forçado, mas ok) e, (4) ele dá de cara com Boris num subúrbio em Nova York.

No reencontro, Boris assume que, na adolescência em Vegas, roubou de Theo a pintura e com ela fez muito dinheiro, mas assume que a perdeu. Theo voltando para o depósito onde acreditava que estava a pintura (enrolada em papel) durante todos esses anos, constata que Boris está falando a verdade. E então, tudo se transforma: Theo que, até aquele momento, pensava em uma maneira de se livrar da pintura sem deixar vestígios, decide retoma-la de volta e a saga pelo submundo da arte se inicia.

No fim das contas, em Amsterdã, depois de algumas mortes onde Theo vira um criminoso/gangster temporariamente, Boris consegue retomar a pintura e devolve-la para as autoridades, por uma soma gigantesca de dinheiro como "recompensa", tudo anonimamente, é claro. Junto com a pintura, muitas outras obras famosas foram resgatas, inclusive um Rembrandt que, segundo consta, foi um dos mestres de Fabritius (que por sua vez foi mestre de Vermeer).

Com o dinheiro que foi dado por Boris e feliz pela pintura, de volta para Nova York, Theo consegue consertar as fraudes da loja de antiguidades, conta tudo para Hobie, e segue a vida - sem Pippa e também "meio" sem Kitsey (o noivado não é desfeito oficialmente, mas Theo continua visitando os Barbour). E o livro termina com reflexões bem deprimidas sobre a vida, mas infelizmente bem fáceis de se identificar:

O Pintassilgo é um livro emocionante, em que a felicidade raramente (ou nunca) tem espaço. Theo vive atormentado por tristezas, traumas, inseguranças, que vão despindo a ficção pra mostrar a vida com suas perdas e suas dores, sem leveza, somente suportável quando vivida pelo véu da arte e da beleza, afinal a beleza altera a textura da realidade e, como diz Nietzsche na citação usada pela própria Donna Tartt temos a arte para não morrer com a verdade.


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